quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

RIO AMAZONAS DEIXA DE SER O MAIOR DO PLANETA. E DAÍ?

Macapá, a capital do estado do Amapá, cortada pela Linha Imaginária do
Equador e debruçada para o estuário do rio Amazonas, a caminho do Caribe


BRASÍLIA, 19 DE FEVEREIRO DE 2014 – Em junho de 2007, uma expedição integrada por pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), da Agência Nacional de Águas (ANA), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Instituto Geográfico Militar do Peru, determinou o local exato da nascente do rio Amazonas. Desde o início da década de 1990, uma equipe do Inpe, chefiada pelo geólogo Paulo Roberto Martini, da Divisão de Sensoriamento Remoto, estudava o Amazonas e o Nilo, por meio de sensoriamento remoto e geoprocessamento, tecnologias utilizadas no Programa Espacial Brasileiro, e imagens dos satélites Landsat, distribuídas pela Nasa, a agência espacial dos Estados Unidos, calculando, assim, minuciosamente, a extensão de ambos os rios, da nascente à foz, com ajuda de um programa de computador; em julho de 2008, bateu o martelo: o Amazonas é o maior rio do planeta.

A nascente do Amazonas foi localizada no rio Apurimac, na cordilheira dos Andes, ao sul do Peru. A nova localidade, até o oceano Atlântico, torna o rio 139,91 quilômetros mais longo do que o africano Nilo, que nasceria no rio Kagera, próximo à fronteira entre o Burundi e Ruanda, correndo até o mar Mediterrâneo. Segundo o Atlas Geográfico Mundial, a extensão do Nilo é de 6.695 quilômetros e a do Amazonas, de 6.515 quilômetros. Com a nova medição, o Amazonas passou a ter 6.992,6 quilômetros e o Nilo, 6.852,15 quilômetros. Paulo Roberto Martini comentou que as medições anteriores foram feitas sem o uso de metodologias científicas: “Esse resultado mostra que, às vezes, as verdades mais bem estabelecidas têm de ser revistas porque podem simplesmente não ser verdade. Pelo menos desta vez não temos, acho. Temos metodologia científica e, por essa leitura, por essa interpretação, você pode colocar nos livros que o Amazonas é maior do que o Nilo”.

Em maio de 2008, o vice-presidente da Sociedade Geográfica de Lima, professor Zaniel Novoa, após 12 anos de investigação, confirmava a versão do explorador polonês Jacek Palkiewicz, que, em 1996, localizou a nascente do Amazonas e afirmou que o rio sul-americano era mesmo o maior do mundo. Até a segunda metade do século XX, os geógrafos apontavam o Nilo como o maior. Desde que o Amazonas foi batizado, em 1500, foram identificadas nascentes em vários pontos do Peru, até a atual, a 5.179 metros de altitude, próximo do monte nevado Quehuisha, na região sul de Arequipa, no Peru, e não nas cabeceiras do rio Marañon, como se pensava. Em 2009, surgiu uma novidade: estudos mostravam que a nascente do Nilo apontava para o rio Rukarara, o que dava ao gigante africano o comprimento de 7.088 quilômetros, 95,94 quilômetros maior do que o Amazonas.

Mas a bacia amazônica é um oceano doce, um realismo fantástico, uma fronteira misteriosa, pouco conhecida e desprezada pelos governos federais e, pasme-se, pelos próprios governos da Amazônia Clássica, apesar de se constituir na mais espantosa província biológica e mineral do planeta.

Em 1500, o navegador espanhol Vicente Yañez Pizón batizou o Amazonas de Río Santa María del Mar Dulce; 42 anos depois, o também espanhol Francisco Orellana mudou-o para Amazonas. O colosso marrom, que no estado do Amazonas recebe o nome de Solimões e nos estados do Pará e Amapá, de Amazonas, é a espinha dorsal da maior bacia hidrográfica do planeta, formada por 7 mil afluentes, 25 mil quilômetros de rios navegáveis, abrangendo uma área, segundo a Agência Nacional de Águas (ANA), de 6,110 milhões de quilômetros quadrados, 40% da América do Sul, e banhando Peru (17%), Equador (2,2%), Bolívia (11%), Brasil (63%), Colômbia (5,8%), Venezuela (0,7%) e Guiana (0,2%).

Da nascente até 1.900 quilômetros, o Amazonas desce 5.440 metros; desse ponto até o Atlântico, a queda é de apenas 60 metros. Suas águas correm a uma velocidade média de 2,5 quilômetros por hora, chegando a 8 quilômetros, em Óbidos, cidade paraense a mil quilômetros do mar e ponto da garganta mais estreita do Amazonas, com 1,8 quilômetro de largura e 50 metros de profundidade. Fora do estuário, a parte mais larga situa-se próxima à boca do rio Xingu, à margem direita, no Pará, com 20 quilômetros de largura, mas nas grandes cheias chega a mais de 50 quilômetros de largo, quando as águas sobem ao nível de até 16 metros. O Amazonas é navegável por navios de alto-mar da embocadura à cidade de Iquitos, no Peru, ao longo de 3.700 quilômetros. Seu talvegue, nesse curso, é sempre superior a 20 metros, e chega a meio quilômetro de profundidade próximo à foz.

A vazão média do rio-mar é de pelo menos 200 mil metros cúbicos de água por segundo, um quinto de toda a água doce de superfície da Terra, o suficiente para encher 8,6 baías da Guanabara em um dia. No Atlântico, despeja, em média, 400 mil metros cúbicos de água por segundo; chega, portanto, a despejar 600 mil metros cúbicos de água por segundo no mar, nas cheias. Num único dia, o Amazonas deságua no Atlântico mais do que a vazão de um ano do rio Tamisa, na Inglaterra. O colosso contém mais água do que os rios Nilo, na África; Mississipi, nos Estados Unidos; e Yangtzé, na China, juntos. O Amazonas tem 60 vezes mais água do que o Nilo. Só a bacia do rio Negro, afluente da margem esquerda do Amazonas, contém mais água doce do que toda a Europa.

Também despeja no mar 3 milhões de toneladas de sedimento por dia, 1,095 bilhão de toneladas por ano. O resultado disso é que a costa do Amapá está crescendo. A boca do rio, que se escancara do arquipélago do Marajó, no Pará, até a costa do Amapá, mede 240 quilômetros, e sua água túrgida de húmus penetra 320 quilômetros no mar, fertilizando a Amazônia Azul setentrional. O húmus despejado pelo gigante no Atlântico torna a costa do Amapá uma explosão de vida marinha, o ponto mais rico da Amazônia Azul, no Brasil mais mal-guardado pela Marinha de Guerra e menos estudado pela academia. Se mais de um terço de todas as espécies do planeta vive na Hileia, a bacia é berço de mais de 2.100 espécies de peixes, 900 a mais do que as dos rios da Europa. Somando-se às 1.200 espécies do Atlântico Norte, a Amazônia Azul é um santuário de 3.300 espécies.

“O que me intriga, não apenas no conteúdo da educação fundamental brasileira, mas também na base de informações científicas e acadêmicas no Brasil, é a pobreza de informações ambientais e biológicas sobre essa região, batizada de Mar Dulce pelo navegador espanhol Vicente Yañez Pinzón, em 1500, mesmo ano em que Cabral achava o Brasil” – comenta o oceanógrafo Frederico Brandini. Ele lembra que, no Amapá, as autoridades estão pouco preocupadas com o estudo da Amazônia Atlântica. As costas do Amapá e do Pará são um inacreditável banco de vidas marinhas, coalhado de piratas, que vão lá pegar, de arrastão, pescados, lagostas, camarão e outros frutos do mar. Pescadores paraenses já capturaram na altura da Vila de Sucuriju, no município de Amapá, marlim azul de meia tonelada. Nem Ernest Hemingway conseguia espadarte desse porte no Gulf Strean.

Em 2011, pesquisadores do Observatório Nacional anunciaram evidências de um rio subterrâneo numa profundidade de 4 quilômetros abaixo do Amazonas, com 6 mil quilômetros de comprimento, batizado de Hamza, em homenagem a um dos pesquisadores, o indiano Valiya Hamza. Porém, tudo o que escrevi neste artigo é apenas realismo fantástico. Os livros continuam com as velhas medidas amazônicas do tempo do Império Britânico. A Amazônia é ainda uma fronteira, uma colônia, sugada ao longo de três séculos, por lusitanos, espanhóis, americanos, ingleses, franceses, holandeses, japoneses, chineses, paulistanos e os governos que se alternam em Brasília.

A Amazônia permanece como colônia, agora pós-moderna, a casa da mãe Joana, sob o beneplácito, a ambição, o jugo, a omissão de Brasília, incluindo-se nesse contexto a bancada da Amazônia no Congresso Nacional, que nunca agiu em bloco no interesse da auto-sustentação dos caboclos do subcontinente. Agora, a aristocracia são as multinacionais e os megaempresários, geralmente laranjas dos países hegemônicos, que dão as cartas.